Atualmente, sempre que tenho noticias do Brasil,
acabo com a sensação que o extremismo anda tomando conta da alma do brasileiro.
Carrego essa ferida aberta na crença de
um povo recheado de santos, orixás e mártires em forma de espírito e carne
dilacerada. Esse Brasil in extremis de ingenuidade, vem dilatando essa
minha revolta em exílio. E isso em várias linhas do pensamento e da ação cívica
e social. As patologias mentais, na
dimensão folclórica do inconsciente coletivo brasileiro, podem assumir a carga de
um cianureto extremamente ágil e letal na membrana da língua. O língua de trapo,
a língua solta, a grande, a língua fraca do desejo de gritar por liberdade, tão
vulnerável à ação do veneno instantâneo. Bem diferente da química letal, na
homeopatia da convivência civilizada, a noção de civismo não passa pelo
respeito e a obediência a nenhuma regra. O civismo existe necessariamente como
filho primogênito da união entre a compreensão do direito e a do dever, ambas constituídas
pela necessidade premente e orgânica de uma convivência ética. Nesse sentido, ouvir historias de marginais
atados em postes, de rifas para custear a penalização de políticos corruptos, de
discursos moralizadores com insígnias verde oliva, de partidos de esquerda ou
personalidades adotadas pelo liberalismo verborrágico, tudo isso vai gerando um
mal estar e uma acidez na boca do estômago, capazes de deixar qualquer um em
estado de insanidade gástrica. Não quero pactuar com as elites de uma gauche
divine que mal entende o francês, nem com as oligarquias de todos os clãs, rurais
e urbanos, acostumados a exagerar na quantidade de comida no prato e sucumbir
aos gazes por tanto champanhe falsificado.
Enfim...
Em ato intermédio, sem que eu saiba onde acaba
a tragédia e começa a comédia, sempre acabo perguntando: Que pais é esse sem
vergonha, que um dia luta, o outro esquece, que taca fogo, que come merda
calado, que se une só porque dois homens deram um beijo na boca em horário
nobre, ou porque algum paparazzi pegou em flagrante a presidenta saindo bêbada de
um restaurante em Lisboa? Não quero deprimir pensando que meus filhos respiram
tanta hipocrisia, enquanto tentam lutar com o que dispõe para alcançar uma vida
melhor. Não quero imaginar o que devem sentir todos aqueles que lutaram durante
décadas, e que agora vivem no dia a dia a sensação de um reality de quinta
categoria. Esse gigante adormecido pode acordar se quiser, e ser um Macunaíma
de verdade, preguiçoso, mas verdadeiramente mulato e transgressor.